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quarta-feira, 5 de maio de 2010

Professor não aprende a avaliar aluno, diz especialista



Apenas 1% dos cursos de graduação para professores têm matérias específicas sobre provas e avaliações nacionais, afirma Bernardete Gatti, da Fundação Carlos Chagas. "O uso de avaliações por parte de professores depende de conhecimento e não do uso 'cego',", salientou, durante palestra na feira Interdidática, ocorrida no final de abril, em São Paulo.

Ela pesquisou os currículos das licenciaturas e cursos de pedagogia brasileiros por meio de dados oficiais divulgados entre 2001 e 2006. A falta de disciplinas sobre avaliação se reflete em como os docentes avaliam seus alunos. Dentre exames feitos por professores e analisados por Bernardete, a pesquisadora afirma ter encontrado "provas incoerentes, feitas 'no joelho', que não foram pensadas com nenhum referencial didático contemporâneo".

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Essa falta de formação --tanto para provas escolares quanto para governamentais (como o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), o Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica) e a Prova Brasil)-- é problemática, pois os docentes "saem sem formação minima para entender as avaliações e fazer críticas fundadas", aponta.

Os profissionais, de acordo com a professora, usam mais a "sensibilidade" do que conhecimentos acadêmicos para avaliar: "Não basta. Precisamos caminhar para ter processos de avaliação desenvolvidos pelo professor", diz.

Na escola
A pesquisadora explica que as avaliações podem alavancar mudanças no dia a dia escolar. Para isso, "é preciso saber fazer e saber ler os dados, interpretar, levantar aspectos pedagógicos, procurar soluções didáticas e mostrar possibilidades de superação de dificuldades pelos meios que dispomos nas escolas", diz.

E isso "bate" na formação docente: em seu estudo, Bernardete constata ainda que, nos cursos que oferecem formação em avaliações, o conteúdo dado trata-se mais de críticas do que de base teórica para entender seu funcionamento. "Os alunos só tem crítica abstrata daquilo que nem conhecem", diz.

Reformulação de currículo
Para resolver o" grande desafio da educação brasileira", segundo aponta a pesquisadora, é preciso que haja uma reformulação do currículo dado nas licenciaturas --tarefa a ser feita pelo governo e pelas universidades. "Nunca tivemos uma política pública da união em relação a aprimorar a formação das licenciaturas e, hoje, estamos numa situação relativamente caótica".

A docente critica a formação a distância, que exige uma alta capacidade de leitura e estudo que nem todos os estudantes têm e diz que os sindicatos deveriam cobrar a qualidade na formação em suas plataformas.

Outro fator apontado é a dificuldade que os graduandos de licenciatura têm em realizar o estágio obrigatório em escolas. "Como você vai fazer estágio de 1ª a 4ª série em curso noturno? Não existe. Eles fingem que fazem estágio... a maioria não faz", conta. Para evitar isso, a pesquisadora aponta que deveria haver mais bolsas para cursos diurnos em vez de noturnos.

Uso de avaliações
A professora diz que a cultura de avaliações começou a ser pensada no final dos anos 80 e se consolidou nos anos 90, enquanto outros países já tinham sistemas avaliativos. Apesar de hoje estarmos além do pensamento de provas como "punição" ou "seleção", a docente diz que as escolas brasileiras ainda usam avaliações apenas como "sinalizadores".

"Precisamos decifrar esses sinalizadores, isso depende de conhecer metodologicamente esses processos. Não estou dizendo de dominar firulas estatísticas, mas a lógica e seus conteúdos, que permitem interpretar esses processos para usá-los em sala de aula".


Ter uma "nota" incentiva as escolas a melhorarem qualidade da educação, avaliam especialistas


O fato de ter um índice que avalie a escola pode ajudar a melhorar a qualidade da educação na instituição. Entre os estabelecimentos que tiveram maior salto no Ideb entre as edições de 2005 e 2007, a motivação primeira para a melhora foi "o próprio Ideb", contou Maria do Pilar Lacerda. "Parece óbvio", disse a secretária da Educação Básica do MEC (Ministério da Educação). Mas, segundo ela explicou, os gestores passaram a ter parâmetros para medir a situação de suas escolas -- e com isso estabelecer metas de melhoria.

Desde sua criação em 2007, a percepção sobre o indicador mudou. "Hoje há uma expectativa [de quando os resultados vão sair]", diz Pilar. Os resultados de 2009 devem ser divulgados em junho -- o Ideb é calculado a cada dois anos.

"As escolas diziam: melhoramos quando conhecemos os resultados, isso nos motivou", disse Jorge Fasce, sobre algumas instituições que apresentaram aumento nos índice das avaliações nacionais da Argentina. Coordenador da área de avaliação do Ministério da Educação, Ciência e Tecnologia daquele país, Fasce contou que algumas províncias de seu país preferem não abrir as "notas" das escolas enquanto outras usam justamente a divulgação para estimular mudanças. No BRasil, o MEC disponibiliza os dados de todas as escolas para o público.

•Ter uma "nota" incentiva as escolas a melhorar a qualidade da educação? Opine
Para Pilar, o fato de consolidar um indicador como o Ideb vai além das melhoras na escola. O índice, na opinião da secretária, tornou-se um instrumento de política pública. "Deixamos de ter um balizamento paroquial e clientelista e passamos a ter uma nova baliza institucional", disse. O MEC utiliza o Ideb como parâmetro para aporte de verbas e apoio pedagógico.

Qualidade da educação
Toda avaliação parte do que se quer medir e como essas habilidades e conhecimentos serão mensurados, explicou Reynaldo Fernandes, ex-presidente do Inep, autarquia do MEC responsável pelo Ideb e pelo Enem (Exame Nacional do Ensino Médio). "Incluir valores, como a socialização [entre o que se quer que o aluno aprenda na escola] é um debate a ser feito", ponderou Reynaldo. Atualmente a Prova Brasil, que compõe o Ideb juntamente com a taxa de reprovação, avalia a aprendizagem de habilidades cognitivas.

Reynaldo também avalia o impacto da avaliação na condução dos projetos pedagógicos: "o índice não chega com o diagnóstico [de onde a escola acertou ou falhou]". E, se a escola entende o propósito da avaliação, esse é um momento de reflexão.

O debate "O que avaliamos quando medimos a qualidade na educação?" faz parte da programação de um encontro latino-americano, que acontece de 28 a 30 de abril em Foz do Iguaçu.

*A jornalista viajou a convite do MEC (Ministério da Educação.

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